sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Pessoas Nada a Ver

É uma das minhas coisas favoritas para se fazer: entrar numa loja Americanas e encher a cesta de chocolates, salgadinhos, cookies e todo o tipo de guloseima que eu tiver direito. Você sai de lá se sentindo outra pessoa, cientista nenhum conseguiria explicar a descarga repentina de endorfina no sangue.

Em um desses ataques de gula e completa falta de discernimento, eu estava na fila do caixa, com a cesta cheia de gorduras saturadas e outras coisas que provavelmente entopem veias, esperando a minha vez. Como de costume, comecei a olhar a banca de revistas que fica ao lado da fila. Algum desses popstars adolescentes era capa de uma revista também adolescente (acho que era a Capricho), e a manchete dizia: "Fulano declara para nossa reportagem: Todo mundo já se apaixonou por alguém nada a ver". Me chamou a atenção.

Era dezembro, eu ainda estava namorando, mas à partir desse dia eu comecei a colocar as pessoas involuntariamente em uma lista mental de "pessoas nada a ver". Tente isso e você verá que elas estão por todas as partes. Quem nunca se apaixonou por um cara completamente incompatível? Um marmanjo com síndrome de Peter Pan? Ou um fedelho antipático, imaturo e prepotente? Quem nunca conheceu um completo babaca com mania de grandeza que acha que tem a verdade suprema sobre tudo? Quem nunca passou noites acordado por um idiota que te iludiu, te prometeu amor, e depois se interessou por alguém que não chegaria nem aos seus pés? Ou, voando ainda mais alto, quem nunca se viu fora de si por um cara comprometido que, na maior cara de pau, te ofereceu uma "amizade colorida em off"?

Pois é. Acho que todo mundo já trombou com alguém nada a ver. A gente se entrega, se apaixona, se humilha,  sofre anos por alguém que nunca vai combinar com a gente, alguém que não é nem um centésimo daquilo que você procura. Mas você está ali, tentando, dando a cara à tapa, dando murro em faca, enfiando o pé na jaca entre outras rimas que resumem uma coisa só: você se destruindo por uma pessoa nada a ver. Nada a ver com seus planos, nada a ver com o que você acredita, nada a ver com você.

E aí o relacionamento acaba -- porque relacionamentos com pessoas nada a ver eventualmente têm um fim -- e você continua insistindo em se importar, em ser amigo, em estar do lado de alguém que nunca esteve do seu lado, nunca foi seu amigo nem durante o relacionamento, depois então... pfff, esquece!

Talvez seja por isso que a gente sofre. Por tentar encontrar em alguém algo que não existe. Por esperar de moleques atitudes maduras. Por sonhar com relacionamentos duradouros e decididos com pessoas que não sabem nem que filme querem ver no cinema e deixam todas as escolhas para você. Por imaginar que algum dia o cara que te abandona numa briga no grupo de teatro da escola vá te dar apoio em alguma situação mais importante.

Pode parecer papo de livro de autoajuda, mas não é nada mais do que a realidade. A vida oferece oportunidades pra gente ver quem esteve ali o tempo todo, quem merece ficar, quem combina com nossas expectativas... e quem não tem nada a ver com nada. Essas últimas, acredite, não merecem fazer parte do seu campo de visão. Elas não têm nada a acrescentar, nada a ser aproveitado. Elas não têm nada de bom a ser visto.

Um comentário:

Gui disse...

O bom de conhecer essas pessoas 'nada a ver' é que isso só evidencia mais o que a gente procura, e aí, nas tentativas seguintes, o estrago é menor, em caso de falha.

Texto muito bem construído. Achei ótimo.

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