quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Cego

Dentro de mim, o tempo parece ter parado. E eu tropeço em cada minuto que ainda resta. Meus medos chamaram meu nome e eu respondi. Há um brilho escuro e opaco dentro dos meus olhos, um aperto sobre-humano na minha garganta, um pouco de sangue em meus pulmões. Minhas células que ainda estão vivas e meus neurônios que ainda respondem a algum sinal elétrico tentam se desfazer de mim, ser livres, encontrar abrigo e paz em qualquer outro lugar, menos nesse corpo complexo, colapsado, dolorido.

Eu perdi minhas outras guerras com tanta honestidade que cheguei a acreditar que nenhuma outra batalha pode ser ganha depois daquelas. E percebo que estou lutando sozinho quando olho ao meu redor. Não há um corpo ou uma alma que vai segurar minhas mãos ou me dar um abraço para que eu possa chorar o quanto eu precisar. Não há nenhuma palavra de afago, de consolo, de compreensão.
De repente, tudo parece estar sendo resolvido no grito, mas eu não quero gritar. Não quero pedir. Não quero implorar.

Então eu desisto aos poucos. Começo pelas letras que escrevi. Abro minhas mãos e deixo aqueles dedos serem livres para agarrarem o que quer que estejam procurando. Respiro fundo e tento absorver o pouco de oxigênio que sobrou depois de tantos soluços, tantas expirações, tanto afogamento. Tateio as paredes procurando por uma saída de emergência, porque tudo ficou tão escuro subitamente. É como se não houvesse mais volta.

Mas se houver, eu vou descobrir, e eu vou correr para fora dessa porta sem olhar para trás. Sem olhar para as peças que ainda ficaram no chão por não se encaixarem. Vou pular de um precipício, vou fingir que tenho asas, vou voar para longe disso tudo.

No entanto, percebo que a verdade está por trás dessa porta, com todas as respostas das perguntas que não tive coragem de fazer. Vejo a sombra de seus pés se movimentando na fresta entre o chão e a porta. Tenho medo do momento em que ela decidir colocar suas mãos frias na fechadura e abrir o que me separa da luz cegante da realidade.

Mas, enquanto isso não acontece, é uma longa e torturante espera. E eu não sei se eu quero saber como isso acaba.

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