terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Abelha

Fevereiro sempre chega pra mim trazendo um pouquinho de esperança, assim como uma abelha que sempre tem um pouquinho de pólen amarelo-vivo preso em suas perninhas. Depois da transição dos primeiros dias do ano, a nostalgia deixa meus dedos e eu posso começar de novo. É sempre assim. Sempre em fevereiro. Sempre no carnaval.

E já faz alguns carnavais que eu tenho aprendido a deixar a banda tocar. Não adianta fugir de certas verdades ou fingir que existe mais algo a ser dito depois de ter ouvido tanta, tanta coisa ruim. Comecei o ano me livrando de algumas coisas que não me faziam mais bem e de outras que nunca mais seriam as mesmas. Não prestar primeiros-socorros a feridos é omissão de socorro. Mas uma vez que o coração para de bater, não adianta tentar reanimá-lo por muito tempo: algumas coisas não têm conserto, não têm volta, não foram feitas para durar para sempre.

Depois de se encontrar e encontrar aquilo que falta em você mesmo, depois de levantar do tombo causado pelo espanto, depois de resistir à maçã mais venenosa do paraíso e de aprender a deixar as coisas irem embora, vem o sol e também as asas. A tempestade passou, afinal. Vem fevereiro, a esperança. Vem o carnaval, o amarelo e as outras cores e os recomeços - todos nós precisamos de recomeços.

Nenhuma abelha fica pra sempre no mesmo campo. É hora de voar e levar sol amarelo-pólen para outras flores. Não faz sentido insistir em procurar vida em um jardim que deixou de ter vida há muito tempo.

"Esqueça o que dissemos
Antes que fiquemos velhos demais.
Mostre-me um jardim que esteja explodindo em vida."
(Snow Patrol - Chasing Cars)

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Let it go


Partes que não são mais nossas vão embora pelo ralo todos os dias. Nossas células morrem e dão lugar a novas. Nossos dentes caem quando somos crianças para que possam nascer outros maiores e mais fortes.

Coisas que um dia fizeram parte de nós deixam de ser nossas o tempo todo, no decorrer de toda uma vida e outras aparecem para preencher espaços que foram criados involuntariamente.

Não adianta querer lutar contra isso. Além de inútil, seria lutar contra a lei da própria natureza: partes nossas têm de ir embora para dar lugar a uma nova versão de nós mesmos, só que mais fortes, mais resistentes, mais aptos a encarar dias diferentes, invernos mais frios, noites mais escuras. Crescemos e no decorrer deste processo abandonamos pedaços de nós mesmos.

É triste, a princípio, o pensamento de ter coisas arrancadas sem a nossa permissão. Elas nos foram dadas e à partir de então começamos a nos acostumar com a ideia de que elas são nossas e de que são instransferíveis e insubstituíveis. fazemos planos com elas e contamos com a sua eternidade sem nos darmos conta de que amanhã elas possam ser apenas doces lembranças.

Mas então descobrimos que existem coisas tão únicas quanto as outras. Nada é igual a nada. Ninguém é igual a ninguém. Um passeio de mãos dadas terá sempre um cheiro diferente dos outros. Beijos têm sabores diferentes e toques são tão singulares quanto nossas impressões digitais. No entanto, sempre existirão pessoas novas e únicas, caminhos inexplorados, beijos com novas texturas e toques com temperaturas diferentes.

Aquilo que perdemos fica marcado em nossas mentes para sempre, assim como tudo aquilo que ganhamos será sempre nosso, por mais que um dia tenha de ir embora. Tomar um banho de chuva para renovar a pele faz bem e a única maneira de não se machucar quando algumas partes de nós precisam ir embora é aceitar que novas composições estão chegando e, enfim, deixá-las ir.

"As brigas que ganhei, nenhum troféu como lembrança pra casa eu levei.
As brigas que perdi, estas sim, eu nunca esqueci, eu nunca esqueci."
(Pato Fu - Perdendo Dentes)

sábado, 14 de janeiro de 2012

O caminho mais fácil nem sempre é melhor que o da dor

Morda a maçã mais vermelha e proibida daquela árvore e todo o seu paraíso ruirá. Aproxime-se mais do fogo e queime suas memórias preciosas. Dê um beijo nos lábios mais saborosos e você saberá o que é a dor.
Perdura a verdade de que noites de inverno são tão frias quanto mãos que se separam e que as folhas do outono caem de seus galhos fortes e secam na terra, sem outro destino para optarem: sozinhas.

Tentamos ser destemidos numa escuridão na qual nos obrigaram a ficar, de castigo. Imaginamos que exista alguma porta para qual correr e encontrar a luz do sol. Nos dedicamos ao pensamento de segurança. E então descobrimos que a escuridão é um lugar seguro. Ninguém pode ver suas fraquezas quando não há luz.

Existe veneno nas coisas mais simples, e elas são as que mais nos atraem.

sábado, 7 de janeiro de 2012

The Same Old Fears

Trombei mais uma vez naquilo que eu gosto de chamar de espanto. E tudo caiu, como um muro fraco.
Construí barreiras ao meu redor e acreditei que elas fossem me livrar de todo o mal, amém. Mas não é assim, não quando o mal vem de cima, e todo mundo tem teto de vidro.
Chuvas de verão efêmeras que não dizem a que vêm, e um ano que já começou acabando. E eu comecei cansado, cansado desse amor que circula na boca das pessoas, só na boca mesmo, que nunca chega nem perto de coração nenhum, que sequer entra em contato com artéria ou sangue pra se transformar em oxigênio ou algo assim.
Quando é que não vão ser só metades e eu não vou precisar me afogar em um mar de poréns, entretantos, pelo menos e, principalmente, por quês?
As piores coisas aparecem de repente. Vêm sem que você esteja preparado para elas. Deixam sequelas em seus lábios. Queimam pedaços do seu pulmão. Não por tristeza, não é tristeza que me faz escrever isso, não é nem de longe tristeza - eu conquistei uma liberdade que havia me esquecido que tinha. Falo isso em nome da raiva. Da raiva por ter acreditado. Da raiva por ter me doado tanto, me desrespeitado tanto, adoecido e me curado sem a ajuda de nenhuma alma viva ou morta que alguma vez tenha estendido uma mão suja para me ensinar qual era o caminho menos apedrejado. E no final eu escolhi o caminho errado, fui correndo com força e crença, doei todos os meus minutos para alguém que os despedaçou como folhas secas do outono onde tudo isso começou. E no final, corri de olhos fechados, acreditando em vozes que não existem, acreditando em amores inventados, e eu corri, corri, corri e trombei mais uma vez naquilo que eu gosto de chamar de espanto.

Cansei da hipocrisia dos dias que fingem que passam mas que deixam um rastro de coisas todas iguais às de sempre.

"Nós somos apenas duas almas perdidas
Nadando em um aquário, ano após ano.
Correndo pelo mesmo velho chão,
o que encontramos?
Os mesmos velhos medos."
(Pink Floyd - Wish You Were Here)

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