quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Rarefeito

Acordei em um dia frio e meu corpo está congelado. Não sinto meus dedos, nem minhas pernas, tampouco meu coração. Parou de bater hoje, talvez. Acordei de sonhos tristes e me pergunto onde se escondem nossas angústias enquanto dormimos. Onde ficam, à espreita, esperando por uma brecha para invadir nossos dias frios?

É humilhante a maneira como eu quase me curvo e imploro "não me machuque, não me faça mal, não quebre esse coração que te foi entregue, tenha piedade, não me deixe morrer em plena vida". É ridícula a forma como eu choro, me dobrando ao meio, pedindo que alguém me socorra.

Acordei no meu inferno astral e consultei meu horóscopo, até. Acendi um cigarro e me senti tolo. Por que a gente envenena o corpo tentando desintoxicar a alma? Acordei em um dia da cor do desespero.

Acordei em meio ao medo, ao medo de perder um chão postiço, ao medo de sentir frio para sempre, ao medo de nunca mais conseguir dormir, ao medo de sentir meu sangue se esvaindo do meu corpo, mesmo que só de maneira figurada. Afinal, quanto medo pode caber dentro da gente?

Acordei sem oxigênio, num dia rarefeito. Com uma febre de menos três graus celsius.
E me pergunto se acordei, mesmo, ou se é só mais um daqueles pesadelos que eu tenho tido ultimamente.
Me acode. Me acorde de verdade.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Bolhas

"A verdade é que se pudéssemos voltar no tempo, nunca andaríamos para frente." Li isso em algum lugar e não sei exatamente quem é o autor dessa frase tão simples e realista. Se pudéssemos voltar no tempo e reparar todos os nossos erros irreversíveis, estaríamos todos isolados, presos cada um em seu passado particular. E o que encontraríamos lá? Nada. Ninguém. Porque, em nossos passados, as pessoas que pertenceram a eles também estariam fora para correr atrás de conjugar melhor seus pretéritos imperfeitos.

Mas não é assim. Estamos todos a mercê do presente, deste exato segundo que pode mudar todo o rumo de nossas escolhas. Somos bolhas ao vento. E como não podemos mudar o passado, desenvolvemos o hábito de inventar o futuro. Chamamos isso de esperança.

Esperamos demais das pessoas. Esperamos que elas nos amem com a mesma intensidade e forma com que as amamos. Esperamos trocas que geralmente não são feitas. Esperamos ouvir certas palavras que talvez não estejam no vocabulário das outras pessoas. Esperamos por certas atitudes que são mais nossas do que dos outros. Prendemos os momentos e as coisas sem perceber que isso não os faria ficar. E no final, sofremos por geralmente não termos controle do tempo e de como as coisas acontecem em função dele.

Talvez seríamos mais felizes se não esperássemos ou esperançássemos tanto da vida. Seríamos pegos de surpresa pelo acaso (mas quem acredita em acaso hoje em dia?) Acordaríamos em uma manhã esperando ter um dia pacato e comum, e então encontraríamos um amor e isso seria inesperado. Depois, deixaríamos esse amor acontecer, simplesmente, sem esperar nada dele, como regar uma planta acreditando que seja apenas um pézinho de hortelã, e então nos surpreenderíamos quando esse amor começasse a gerar frutos grandes, brilhantes e suculentos. Seríamos felizes com as surpresas, e não sofreríamos com o fracasso das nossas meras ilusões.

No entanto, não conseguimos. Precisamos de esperança para viver, para levantar de nossas camas quentes pela manhã e encarar o que quer que esteja por vir, com a tal esperança de que venham coisas boas.
E no final de nossas esperanças, enquanto estamos machucados e soterrados pelos nossos próprios pedaços, descobrimos que é sempre possível criar novos caminhos ao acaso (será que eu acredito mesmo nisso?), novas esperanças a que se agarrar. E que há sempre um céu com estrelas (que são quantas, mesmo?) para nos mostrar nossas próprias coordenadas.


- para mim, para meu irmão-amigo-anjo Ricardo Hiro, e para todos aqueles que ainda têm esperança em qualquer coisa.

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