segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Infinito até que deixe de ser

Estava conversando com uma amiga quando ela me surpreendeu com a notícia de que seu namoro de mais de um ano havia acabado. "Como assim?", perguntei incrédulo. "Não era tudo que você queria?". Ela visualizou a mensagem no Facebook, ensaiou algumas mensagens que não enviou, até que, minutos depois, respondeu "Era... Até que deixou de ser."

Lembrei-me na hora do Soneto de Fidelidade de Vinícius de Moraes, que diz "Que não seja imortal, posto que é chama / Mas que seja infinito enquanto dure." Fala de amor, é claro. Dos romances que desejamos que sejam eternos. É o que todo mundo quer, afinal, quando algo é bom. Quando algo é tudo aquilo que procurávamos, tudo aquilo que queríamos. Até que deixe de ser.

Mas não é só ao amor e aos relacionamentos amorosos que isso se aplica. Que seja infinito até que deixe de ser faz sentido em vários outros departamento de nossas vidas. Nossos amigos, por exemplo, que são os melhores. São as pessoas que mais nos entendem no mundo, são a família que escolhemos para nós. Amizade é algo infinito e insuperável, certo? Certo. Até que deixe de ser.

Morar com nossos pais é uma das coisas mais prazerosas da vida, até que deixe de ser. Tem comida na mesa todos os dias, sem que você precise se aproximar do fogão - na pior das hipóteses, você apela para o freezer e o microondas. As roupas estão sempre limpas, cheirosas, amaciadas. Há sempre o abraço consolador da sua mãe, as palavras duras e verdadeiras do seu pai. Mas um dia a gente acorda e percebe que não faz mais parte daquele lugar. Que aquela convivência faz mais mal do que bem. Que as pessoas não estão mais se entendendo, falando línguas diferentes.Você percebe que o ninho era o seu lugar, até que deixou de ser.

E as profissões que escolhemos para nós? A gente sempre entra em um emprego com vários planos. O que vamos fazer com o primeiro salário? Quem vamos ser dentro da empresa em alguns meses? Era o emprego que eu queria, meu Deus, obrigado! Você lutou tanto para estar lá, vestiu-se da melhor forma para a entrevista, abriu mão dos seus piercings e cobriu suas tatuagens com as mangas longas de uma camisa social, logo você que sempre gostou de camisetas largas e confortáveis. Nos primeiros meses, mil maravilhas. Até que algumas coisas minúsculas vão se unindo e transformando tudo em uma grande bola de neve, e você descobre que não quer mais aquele emprego, que não quer mais se vestir dessa forma, que quer furar de novo o piercing que já até fechou, que não está feliz trabalhando com aquelas pessoas, dentro daquela carga horária, vivendo para o trabalho. Era o emprego perfeito, até que deixou de ser.

Também deixaram de ser as duas faculdades em que tentei me aventurar. Deixaram de ser os livros que comecei a escrever, esse, sim, vai ser um best-seller. O cara por quem eu decidi que ia lutar com todas as minhas forças deixou de valer o esforço. As amizades que acreditei que seriam eternas deixaram de ser. Os livros que comprei acreditando que seriam superinteressantes e transformadores, estão encostados na estante até hoje: deixaram de ser logo nas primeiras páginas.

Muitas coisas na vida são assim: aquelas que eram muito importantes, essenciais e insubstituíveis, deixam de ser antes que a gente perceba. O importante é conseguir encarar esses momentos. Entender que é o ciclo das coisas, posto que são chamas, e que a vida é um verdadeiro fogo de palha. Tudo é infinito até que deixe de ser. Tudo vale a pena até que deixe de valer. E depende de cada um de nós ter forças para deixar de ser cego e encarar a realidade, quando precisamos deixar de ser.

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