sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Deixe o céu cair


É interessante a forma como o céu sempre foi usado como ponto de referência para diversas coisas que fazemos em nossas vidas. Os antigos navegadores o usavam como mapa. Os meteorologistas o observam para prever fenômenos naturais. Os astrônomos o quebram em milhões de partes para encontrar algum padrão que desvende o mistério da vida. Os pássaros sentem o magnetismo da Terra e usam o céu como estrada. Nossas vidas são diretamente influenciadas por um teto azul-claro e, em razão disso, é para lá que apontamos nossos maiores planos e desejos: para as estrelas-cadentes que o cruzam, para um deus que o habita, para o alto que desejamos chegar.

Não seria, portanto, nada menos do que desesperador quando o céu começa a desabar. Poucos de nós conseguem identificar o que está acontecendo, mas quando olham para cima e se dão conta de que faltam alguns pedaços do firmamento, o pânico se instala. Mas, até você perceber isso, leva um tempo.

Primeiro você ouve um som. Um conjunto de sílabas, um telefone tocando, uma televisão dando uma notícia. Você não está preparado para aquilo - nenhum de nós está. E então você sabe, subitamente, que as coisas vão mudar. Que nada do que você conhece continuará o mesmo.

A forma como as pessoas que você nunca pensou que te decepcionariam partem da sua vida. O medo que você havia superado há muito tempo volta a te assombrar. As medidas drásticas que você nunca pensou que fossem ser colocadas em uso se tornam sua única opção. E, quando você vê, é tarde demais. Não dá mais tempo de remendar, de tapar o buraco, de fingir que não ouviu. O céu desaba de tantas formas que a gente mal percebe que está acontecendo. Mas está. Pedaços gigantescos de firmamento vivem caindo sobre nossas cabeças durante a vida toda, nos deixando desnorteados, manchando nossas memórias boas.

Uma vez que você não tem o céu sobre você para te guiar, você está caminhando sozinho, sem pistas, sem mapas. Sem ter para onde endereçar nossas dúvidas, nossos desejos, nossas esperanças, geralmente ficamos parados, ouvindo os estrondos colossais que fazem o chão tremer, sentindo a poeira fria levantada, tentando nos proteger da tragédia. Fechamos os olhos e simplesmente deixamos o céu cair.

Não é fácil e nem é bonito. Cada um de nós sabe bem disso. Depois que o céu desaba, fica um vazio. Você estava lá, viu tudo caindo, e não pôde fazer nada. Porque o céu é muito grande, tão grande quanto os sonhos que você depositou nele. E você é muito pequeno. Quase invisível.

Quando o desastre acaba, nós estamos parados no meio dos escombros. Não há placas indicando para onde ir, e a gente tem que usar o próprio coração como bússola. E é aí que a tarefa mais importante da sobrevivência começa: procurar dentro de nós as nossas próprias estrelas, pendurá-las na escuridão e traçar mapas mais precisos e seguros no céu, para que ele não desabe de novo.

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