sábado, 19 de abril de 2014

Assopro

É inquieto o silêncio que me acorda durante as madrugadas. Faz tempo que o ouço. É uma voz que não é de ninguém. É um som sem timbre, sem nota, sem vibração. Tudo o que me assombra, tudo o que me esclarece, tudo o que é sólido e invariavelmente derrete, me afoga em um copo fundo de palavras em código. Meu cérebro se sobrecarrega, não há verdade ou mentira, não há hoje ou ontem - é tudo sempre, é tudo aqui.

Leio os lábios invisíveis que se pronunciam, batendo seus dentes escuros e refletindo no esmalte as luzes de uma cidade morta. Mas nada é claro, e eu sou surdo. Tateio as paredes no escuro, procurando por uma porta, procurando por uma saída. Minhas mãos me enganam e eu trombo e caio.

Quem me pediu para esperar, me viu correr como um cometa. Não há lucidez, oxigênio ou calor que me prenda a algum lugar. Tudo aquilo que se repete dia após dia, minuto após minuto, faz com que eu me sinta menos vivo, menos real, como se eu estivesse me dissolvendo, me desbotando, me prendendo aos papéis de parede da decoração. Não sou daqui, eu penso. Não sou de nenhum lugar, porque minha alma é itinerante. Minhas asas se abrem e eu tenho que voar, não importa quando nem para onde.

Subo tão alto e me deparo com um buraco negro. É como se ele estivesse me esperando o tempo todo. O silêncio pressiona meus tímpanos de novo. Sinto sua língua provar do meu sangue. O nada se funde com o tudo. Suga tudo para a inexistência e, quando tudo desaparece, o nada suga a si mesmo. A partícula de nada, tão pequena que nem existe, implode e gera planetas, galáxias, estrelas. Todos eles cheios de tudo, cheios de nada. O silêncio assombra nos cantos escuros da mente, e quem ouve não entende.

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