segunda-feira, 10 de março de 2014

Sozinho é um lugar mais seguro


Eu não queria dormir sozinho. Eu tinha dez anos e tudo ao meu redor naquele quarto iluminado apenas pela luz de um abajur eram sombras, medo, fantasmas. Eu me deitava na cama para dormir, mas o que eu realmente fazia era ficar acordado, em vigília, esperando pelo momento do bote, do terror iminente e inevitável. Em pânico, eu corria para o quarto da minha irmã e, de manhã, era repreendido pelos meus pais. "Você precisa enfrentar seus medos. Isso é coisa da sua cabeça. Nada vai acontecer."

Aqueles dias se foram. Hoje, olhando para trás, vejo que, embora tudo pareça igual, está muito diferente. O aleatório é uma ilusão. Enquanto você dorme - quando você consegue ignorar seus fantasmas, enfrentar seus medos, acreditar que nada vai acontecer -, as linhas do acaso se unem em padrões quase imperceptíveis, transformando todo o cenário.

Aqueles fantasmas também se foram e eu sinto falta deles. Dos medos imaginários que eu podia enfrentar ao fechar meus olhos e fazer uma oração - porque minha fé estava intacta, virgem, inocente, antes de ter sido removida de mim a duros golpes de palavras.

Hoje meus fantasmas são outros. São alimentados por coisas empíricas. Agarram-se nas linhas soltas do acaso. São baseados em fatos reais. A diferença é que hoje eu quero - e preciso - dormir sozinho. Estar só é a única forma de combatê-los. Sozinho é minha prece. Sozinho ninguém me fere. Sozinho eu leio, eu canto, eu durmo, eu sonho, eu danço. Sozinho eu chego, eu alcanço. Sozinho eu existo de verdade, de dentro pra fora. Sozinho é um lugar mais seguro.

Enquanto escrevo essas palavras, ouço o silêncio da solidão em um lugar que, durante o dia, é confuso, é intenso, é assustador. Todos estão dormindo: as sombras, os medos, os fantasmas... E, quando eles acordarem, eu estarei dormindo, eu estarei seguro. Sozinho nada vai me acontecer.

Um comentário:

Maicon Vijarva disse...

Inspirador. Muito bom a forma como conduzira o texto. Parabéns!

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