Trombei mais uma vez naquilo que eu gosto de chamar de espanto. E tudo caiu, como um muro fraco.
Construí barreiras ao meu redor e acreditei que elas fossem me livrar de todo o mal, amém. Mas não é assim, não quando o mal vem de cima, e todo mundo tem teto de vidro.

Chuvas de verão efêmeras que não dizem a que vêm, e um ano que já começou acabando. E eu comecei cansado, cansado desse amor que circula na boca das pessoas, só na boca mesmo, que nunca chega nem perto de coração nenhum, que sequer entra em contato com artéria ou sangue pra se transformar em oxigênio ou algo assim.
Quando é que não vão ser só metades e eu não vou precisar me afogar em um mar de poréns, entretantos, pelo menos e, principalmente, por quês?
As piores coisas aparecem de repente. Vêm sem que você esteja preparado para elas. Deixam sequelas em seus lábios. Queimam pedaços do seu pulmão. Não por tristeza, não é tristeza que me faz escrever isso, não é nem de longe tristeza - eu conquistei uma liberdade que havia me esquecido que tinha. Falo isso em nome da raiva. Da raiva por ter acreditado. Da raiva por ter me doado tanto, me desrespeitado tanto, adoecido e me curado sem a ajuda de nenhuma alma viva ou morta que alguma vez tenha estendido uma mão suja para me ensinar qual era o caminho menos apedrejado. E no final eu escolhi o caminho errado, fui correndo com força e crença, doei todos os meus minutos para alguém que os despedaçou como folhas secas do outono onde tudo isso começou. E no final, corri de olhos fechados, acreditando em vozes que não existem, acreditando em amores inventados, e eu corri, corri, corri e trombei mais uma vez naquilo que eu gosto de chamar de espanto.
Cansei da hipocrisia dos dias que fingem que passam mas que deixam um rastro de coisas todas iguais às de sempre.
"Nós somos apenas duas almas perdidas
Nadando em um aquário, ano após ano.
Correndo pelo mesmo velho chão,
o que encontramos?
Os mesmos velhos medos."
(Pink Floyd - Wish You Were Here)